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O ICMS-Difal pode ser exigido no exercício de 2022?

 

Por Ana Caroline Ferreira

Com a sanção da Lei Complementar 190/2022 um dos assuntos mais procurados pelos contribuintes nesse início de ano é sobre o Diferencial de Alíquota de ICMS (ICMS-Difal) incidente nas operações interestaduais de (i) entrada com aquisição de mercadorias destinadas ao uso e consumo ou à integralização ao ativo imobilizado e (ii) operações de saída com consumidores finais não contribuintes do imposto.

O que é o ICMS diferencial de alíquotas?

O Diferencial de alíquota do ICMS surgiu em 2015 em razão do grande crescimento de vendas pela internet por comércios digitais (e-commerce), pois antes, a arrecadação do imposto era gerada somente para o estado de origem da mercadoria.

Agora, em uma operação interestadual destinada ao consumidor final (uma venda a um cliente de outro estado), o Difal representa a diferença entre a alíquota interna de ICMS do estado destinatário e a alíquota interestadual do estado remetente.

Dessa forma, toda vez que uma empresa que recolhe o ICMS (exceto Simples Nacional) faz uma venda em outro estado, ela é obrigada a calcular e realizar o pagamento do ICMS-Difal.

Assim, o Estado onde está localizado o consumidor final, recebe o valor do diferencial de alíquota e o cálculo do imposto consiste em encontrar o valor de diferença entre a alíquota interna e interestadual. Vejamos:

  • Região norte, nordeste, centro-oeste e Espírito Santo: 7%
  • Região Sul e sudeste: 12%
  • Produtos importados ou com conteúdo de importação igual ou superior a 40%: 4%

Como a arrecadação do fisco estadual com o Difal é muito elevada, os olhares dos contribuintes e dos Estados estão direcionados para os efeitos da sanção da Lei Complementar 190/2022, que veio regulamentar o tributo.

A polêmica da sanção da Lei Complementar 190/2022

No dia 05 de janeiro de 2022, a presidência da República sancionou a Lei Complementar 190/2022, com o objetivo de regulamentar a cobrança do ICMS – Difal.

Essa movimentação legislativa ocorreu em razão das decisões do Supremo Tribunal Federal – STF, no RE 1.287.019 e na ADI 5.469, ambas de 24 de fevereiro de 2021, onde declararam a inconstitucionalidade de algumas cláusulas do Convênio ICMS nº 93/2015.

O Convênio ICMS nº 93/2015 pretendia regulamentar as alterações trazidas pela Emenda Constitucional 87/2015, que determinou que nas operações e prestações interestaduais com consumidores finais não contribuintes deveriam incidir as alíquotas interestaduais e não mais as alíquotas internas dos estados de origem, sendo devido aos estados de destino apenas a diferença entre as alíquotas internas e interestaduais, o chamado diferencial de alíquota (ICMS-Difal).

O STF também entendeu que as alterações promovidas em relação ao tributo pela Emenda Constitucional 87/2015 seriam aplicáveis somente com a edição de Lei Complementar, validando as inconstitucionalidades identificadas até 01 de janeiro de 2022, por meio de modulação, ou seja, somente até 31/12/2021 que o diferencial de alíquota poderia ser exigido sem edição de Lei Complementar.

 Tal “exceção” foi pensada pelo fato do grande impacto que implicaria aos cofres dos Estados e, por essa razão, o STF modulou os efeitos e permitiu que o diferencial de alíquotas pudesse ser exigido sem lei complementar durante o ano de 2021.

Em termos práticos, foi dado ao Congresso Nacional um prazo para aprovação de um projeto de Lei Complementar, que se extinguiu em 31/12/2021, pois do contrário, não seria possível exigir o ICMS-Difal nas remessas interestaduais para não contribuintes em 2022.

Os parlamentares fizeram sua parte e foi aprovado o PLP 32/2021 ainda dentro do prazo, sendo o texto remetido à sanção presidencial no dia 20 de dezembro de 2021. Contudo, como se sabe, não houve sanção e publicação da lei no diário oficial da união em 2021. O PLP 32/2021 somente teve status de Lei Complementar em 05 de janeiro de 2022, data da publicação da LC 190/2022.

Quando o ICMS-Difal em operações de remessas interestaduais poderá ser exigido?

Em linhas gerais, como a Lei Complementar foi publicada somente em 2022, não restam dúvidas de que a cobrança poderia ocorrer apenas a partir de 01 de janeiro de 2023. Isso se deve ao fato de que o ICMS é um tributo sujeito aos princípios constitucionais das duas anterioridades (12 meses e 90 dias) e, assim, não há como aplicar um princípio sem o outro, a não ser que a expectativa de publicação da lei fosse dentro dos últimos 90 dias do ano de 2021, o que não ocorreu devido ao atraso da presidência da República, que sancionou a lei fora do prazo disposto pelo STF.

Nesse sentido, a Constituição veda no artigo 150, III, “b”, a exigência de tributos no mesmo exercício financeiro em que tenha sido publicada a lei que o instituiu ou o aumentou. Trata-se do princípio de anterioridade anual, já citado, que busca proteger e trazer mais segurança jurídica aos contribuintes para que não sejam surpreendidos pelos entes tributantes.

Cabe destacar que também foi publicado o Convênio nº 236, pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que autorizou os Estados a cobrarem imediatamente o ICMS-Difal.

Em meio às discussões, alguns contribuintes resolveram recorrer ao Judiciário e vêm recebendo decisões favoráveis sobre o tema. 

A título exemplificativo, temos a decisão a liminar que foi concedida pelo juiz da 8ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, no processo nº 1000415-3520228260053, que determinou a suspensão do ICMS-Difal exigido pelo Estado de São Paulo com incidência do princípio nonagesimal. O magistrado, no entanto, não deixa claro na decisão se a suspensão dos valores vale para o ano ou apenas para o intervalo dos primeiros três meses.

Fato é que o ICMS-Difal previsto na LC 190/2022 não poderá ser exigido no exercício de 2022 ou que, no mínimo, a cobrança ocorra somente 90 (noventa) dias após a publicação da LC 190/2022.

Como os contribuintes deverão recolher o ICMS nas operações interestaduais que destinem mercadorias e serviços a consumidores finais não contribuintes em 2022?

Antes de deixar de recolher o ICMS-Difal, as empresas que estão sujeitas ao recolhimento do diferencial de alíquotas  devem estar atentas e procurar profissionais capacitados para discussão do tema e orientações que possam defender seus interesses nesse contencioso em face dos Estados que, conforme exposto, estão exigindo o recolhimento do imposto na contramão do que dispõe os princípios constitucionais.

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