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COVID-19: A Recuperação Judicial como estratégia de enfrentamento à crise

O abalo no cenário econômico causado pelo COVID-19 vem se alastrando dia após dia. Devido a estagnação das atividades econômicas, a recuperação judicial mostra-se como importante alternativa para o soerguimento de empresas em situação de crise econômico-financeira, viabilizando a preservação do empreendimento.

Oportuno destacar que várias são as estratégias que antecedem um pedido de recuperação judicial. Ideias como a criação de comitês de crise, maior aproximação com clientes, fornecedores, pleito para postergação de pagamentos, renegociação de contratos de locação, redução de contratos de trabalho, dentre outras, são medidas extraordinárias atualmente possíveis.

Entretanto, em casos mais agudos, a recuperação judicial pode ser uma excelente estratégia para enfrentamento à crise. Conheça as características das principais modalidades:

Plano Convencional de Recuperação

No modelo convencional de recuperação judicial há necessidade de apresentação do denominado plano de recuperação, produzido segundo especificidades da empresa recuperanda. Para eficácia, tal plano deve ser aprovado pelos credores. Em média, entre o processamento do pedido e a realização da assembleia geral de credores, observa-se o prazo de 12 meses. Após a realização da assembleia (e aprovação do plano), o prazo de carência para o início do adimplemento pode atingir 18 meses, à depender das condições objetivas negociais. Já o prazo para pagamento varia bastante, podendo se estender por até 120 meses.  

Certo que o número de pedidos de recuperação judicial tendem a aumentar neste período. Além disso, a conjuntura atual impactará negativamente no cumprimento dos planos de recuperação judicial já aprovados, sujeitando empresas a convalidação em falência pelo descumprimento do plano se aplicássemos a literalidade da Lei de recuperações.

Antevendo e posicionando-se sobre essas situações, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ publicou a Recomendação CNJ nº 63/2020 dirigida aos juízos de competência para julgamento de ações de recuperação judicial. A ideia central é permitir que as empresas em recuperação possam continuar suas atividades, cumprindo sua função social, protegendo empregos e a própria economia. São, em síntese, as medidas recomendadas:

a) priorizar a análise e decisão sobre levantamento de valores em favor dos credores ou empresas recuperandas;

b) suspender Assembleias Gerais de Credores presenciais, autorizando a realização de reuniões virtuais quando necessária para a manutenção das atividades empresariais da devedora e para o início dos pagamentos aos credores;

c) prorrogar o período de suspensão previsto no art. 6º da Lei de Falências quando houver a necessidade de adiar a Assembleia Geral de Credores;

d) autorizar a apresentação de plano de recuperação modificativo quando comprovada a diminuição na capacidade de cumprimento das obrigações em decorrência da pandemia do COVID-19, incluindo a consideração, nos casos concretos, da ocorrência de força maior ou de caso fortuito antes de eventual declaração de falência (Lei de Falências, art. 73, IV);

e) determinar aos administradores judiciais que continuem a promover a fiscalização das atividades das empresas recuperandas de forma virtual ou remota, e a publicar na Internet os Relatórios Mensais de Atividade; e

f) avaliar com cautela o deferimento de medidas de urgência, despejo por falta de pagamento e atos executivos de natureza patrimonial em ações judiciais que demandem obrigações inadimplidas durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6 de 20 de março de 2020.

Plano Especial de Recuperação para Micro e Pequenas Empresas

Embora a crise gerada pela pandemia atinja a todos os níveis empresariais, as micro e pequenas empresas sem dúvidas estão entre as mais prejudicadas. Tal situação é esperada, tanto que a Lei Complementar nº 123/2006 prevê tratamento diferenciado às pequenas empresas, em vários níveis econômicos, que vão desde vantagens na contratação com o poder público ou maior flexibilidade nas relações com o fisco.

No âmbito da recuperação judicial, a Lei nº 11.101/2005, também previu tratamento benevolente às micro e pequenas empresas, ofertando um plano especial de recuperação, mais célere, simplificado e com a dispensa da assembleia geral de credores. Tal política garante aos pequenos empresários o adimplemento do passivo em 36 parcelas mensais, acrescidas de juros equivalentes a SELIC, tendo como carência 180 dias após o deferimento do plano. Além disso, o plano pode prever um deságio no valor da dívida, desde que fundamentado no plano especial.

Em que pese a intenção do legislador em proteger as empresas de pequeno porte, possibilitando o plano de recuperação especial mais acessível do ponto de vista econômico, imprescindível que a empresa que pretende pleitear a recuperação analise se de fato será mais benéfico o plano especial de recuperação.

Isto por que, no plano de recuperação judicial especial, se uma classe com mais de 50% dos créditos recusarem o plano de recuperação, ao juízo cabe o decreto falimentar, ou seja, deve-se ter muito cuidado com a proposta de eventual deságio.

Por fim, a rotina da recuperação judicial guarda inconvenientes burocráticos, pois qualquer investimento ou desfazimento de algum ativo por parte da recuperanda necessitará de autorização prévia solicitada pelo administrador judicial ao juízo competente. 

Independente do modelo recomendado, o instituto da recuperação judicial já se mostrou por vezes extremamente eficiente no enfrentamento de crises, seja por pequenas ou grandes empresas. No cenário atual, um plano de recuperação bem elaborado, de fato pode ser uma salvaguarda da atividade econômica empresarial, devendo empresários e gestores avaliarem minuciosamente, com base em diagnóstico prévio, qual a melhor estratégia a ser seguida.

Cristiano Roveda

Sérgio Melo

 

Atualizado em 23/07

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