pt-br

A importância do acordo entre sócios

A importância do acordo entre sócios.

Indispensável para resguardar os interesses de sócios e da sociedade, o acordo de sócios ou de acionistas é um dos instrumentos vitais para a efetiva continuidade de empresas e relações entre sócios. Por isso, deve estar na ordem do dia de companhias que visam crescer e se estruturar de forma ordenada.

Historicamente, o desajuste entre sócios está entre as diversas causas de mortalidade das empresas [1], principalmente por envolver cenários que não foram definidos previamente em instrumentos contratuais. Regras para reinvestimento, destinação do lucro líquido, condições para aumento de capital e métodos de alienação de quotas, ou ações, são alguns exemplos que previamente estipulados em acordo de sócios podem ter potencial para esgotar boa parte dos problemas que resultam na morte de negócios pelo País.

Em síntese, o acordo nada mais é do que um contrato que se destina a estabelecer diretrizes sobre o comportamento dos contratantes em relação à sociedade de que participam. Funcionando como um instrumento de composição de grupos seja de sócios, no caso de sociedades limitadas, ou, de acionistas em caso de sociedades anônimas.

É evidente que o acordo visa trazer benefícios a todos os signatários, mas o direito e segurança trazidos aos sócios minoritários é notório, uma vez que a alteração do acordo só ocorre mediante a concordância de todos os signatários. Diferentemente do contrato social que poderia prever maioria qualificada para determinadas matérias, sujeitando assim os minoritários ao aceite do que fora decidido somente entre os sócios majoritários.

Com previsão na Lei nº 6.404/76, precisamente em seu art. 118, o dispositivo limitou o acordo a três objetivos determinados:

  1. Compra e venda de ações;
  2. Preferência para adquiri-las;
  3. Exercício do direito de voto.

Extrai-se do dispositivo acima, a possibilidade de estabelecer regras sobre a alienação de ações, direito de preferência na aquisição e regras sobre direito de voto, entretanto, em que pese o legislador tenha trazido os objetos acima, nada impede que os signatários do acordo o celebrem com outras finalidades.

Por conta da natureza contratual do acordo de sócios, seu conteúdo pode disciplinar temas de naturezas diversas, possibilitando que os signatários criem obrigações entre si e não necessariamente restrito ao direito de voto, alienação de quotas ou ações conforme dispõe o referido art. 118.

É natural que surjam dúvidas sobre o momento da celebração desta modalidade de contrato e, por tratar-se de um instrumento que visa resguardar os direitos dos signatários, mas, sobretudo, da sociedade, é fundamental que seja celebrado antes de qualquer possibilidade de desavença entre os sócios. É na calmaria que se verifica o momento ideal para sua celebração, pois em um cenário de turbulência, dificilmente se chegará a um consenso quanto às suas disposições.

Com objetivo de estabelecer previsões que não são abarcadas pelo contrato social da sociedade, seja por impossibilidade formal, legislativa ou de estratégia empresarial, deve o acordo ser firmado de modo a estender poucas previsões que já constam em contrato social.

Visando a contratação prévia de como se dará a condução dos negócios sociais a partir de sua celebração, o acordo de sócios ou acionistas pode fixar regras como:

Transferência de quotas ou ações. Esta previsão tem relação direta com planejamentos sucessórios realizados por sócios signatários do acordo. A ideia central das transferências autorizadas é estabelecer que os sócios signatários do acordo que pretendam iniciar um projeto de sucessão empresarial e/ou patrimonial tenham a liberdade de ceder suas quotas a filhos e esposas visando atingir o planejamento sucessório, não sujeitando estas cessões às regras de preferência, primeira oferta e entre outras cláusulas que impactem em transferência de quotas ou ações.

Tag e Drag along. Cláusulas bem comuns em acordos e parte integrante das transferências de quotas ou ações, porém, somente por uma questão de ordem serão tratadas individualmente. A primeira, trata-se da possibilidade de um sócio ou acionista minoritário ser incluindo em uma venda de quotas ou ações dos demais sócios majoritários, nas mesmas condições da venda realizada por estes. Em cenário contrário, a cláusula de Drag Along, normalmente é um direito do majoritário. Basicamente, a cláusula de Drag visa incorporar em uma venda de participação dos majoritários, a totalidade das quotas ou ações dos demais sócios ou acionistas minoritários.

Put e Call Option. Como mencionado anteriormente, em razão da natureza contratual do acordo, muitos dos temas que são delineados no instrumento não tem previsão legal expressa, como é o caso das cláusulas de put e call option. Alguns acordos podem estabelecer que, em determinadas circunstancias específicas, os sócios ou acionistas podem: (i) obrigar que os demais acionistas adquiram suas quotas ou ações (put option); ou (ii) exigir que os demais acionistas alienem suas quotas ou ações à um determinado sócio ou acionista. Importante mencionar que na grande maioria das cláusulas aqui citadas, tão importante quanto a inclusão destas no acordo são os procedimentos para o exercício de cada uma delas, tais como: prazos, notificações, hipóteses bem definidas de quando podem ser utilizadas, valor, forma de avaliação das ações adquiridas pelo exercício de put e call option, ou seja, as redações deve ser completas, da previsão ao procedimento.

Transferências autorizadas de quotas ou ações. Esta previsão tem relação direta com planejamentos sucessórios realizados por sócios signatários do acordo. A ideia central das transferências autorizadas é estabelecer que os sócios signatários do acordo que pretendam desenvolver planejamento sucessório tenham a liberdade de ceder suas quotas a filhos e esposas visando atingir o planejamento sucessório, não sujeitando estas cessões às regras de preferência, primeira oferta e entre outras cláusulas que impactem em alienação de quotas ou ações.

Resolução de conflitos. É preciso estabelecer como serão resolvidos os litígios envolvendo as partes signatárias do acordo. Totalmente conveniente estipular que os litígios serão encaminhados inicialmente a mediação e, não sendo resolvidos, serão direcionados ao procedimento arbitral. A propósito, a Arbitragem é essencial na resolução de conflitos societários, justamente pela especialidade, sigilo e agilidade, o que raramente se verifica no Poder Judiciário. Por fim, importante atentar-se a câmara que será submetida o litígio, uma vez que os custos podem ser elevados e por sua vez inviabilizar o exercício do direito pelo prejudicado.

Vejam que as matérias passíveis de inclusão no acordo de sócios são extensas, variando desde cenários puramente econômicos e financeiros até a simples aquisição de quotas, ou ações, ou mesmo a preferência para adquiri-las.

Outro fator importante diz respeito ao prazo de vigência. Não são raros os casos de acordos celebrados por prazo indeterminado, gerando de pronto um problema importante: acordos de sócios firmados por prazo indeterminado podem ser resilidos, ou seja, havendo um signatário que não tenha interesse em sujeitar-se as normas do acordo, basta denuncia-lo, ficando desvinculado das obrigações assumidas, bastando somente manifestar seu interesse na desvinculação.

Normalmente, instrumentos desta natureza tem prazos que variam entre 10 a 20 anos, ou vinculados ao prazo para obtenção de uma condição resolutiva expressa, o que retira o direito da simples manifestação de desvinculação, uma vez que persistindo a condição resolutiva persiste também o prazo de existência do acordo.

Por fim, destacamos que sócios e acionistas normalmente estarão de frente com acordos em dois momentos (i) na estruturação do negócio, ou seja, no início do projeto de empreender alguma atividade empresarial e, obviamente, na existência de dois ou mais sócios; e (ii) no ingresso de um investidor, seja um fundo de investimento ou mesmo investidor estratégico buscando consolidar mercado. Certo que em ambos os momentos, a estruturação do acordo deve ser feita por profissionais especialistas da área, que tenham amplo conhecimento em todas as matérias tratadas no acordo.

 

Sérgio Melo

 

[1] CAUSA MORTIS. Sebrae. 2014. Disponível em<https://m.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/SP/Pesquisas/CAUSA%20MORTIS_vf.pdf>. Acesso em: 6/11/2020.

Leave a Reply